25 de jun. de 2008

HISTÓRIAS DO MEU PAI - Nº2

A Briga do Fernando com mais de 100, pra me defender


Com as operações perdi muita escola. Mas finalmente comecei a freqüentar um “grupo escolar”. Entrei com mais de 07 anos. Era a Escola Emilio Meyer e ficava na mesma rua que morávamos. A minha professora também morava na mesma rua, era a Dona Glaci.

Um dia eu estava no recreio, andando de um lado para o outro no imenso pátio. Comia tranquilamente meu pão com ovo, minha merenda diária, quando de repente aparece na minha frente o irmão Fernando.

Eu disse: Como é que você entrou aqui? (era proibido entrada de quem não era aluno) E ele respondeu: Isto não te interessa, seu bobalhão! Eu vi aquele guri te dar um encontrão e tu nem reagiu!

Ora encontrão a gente sempre levava, já que eram mais de 100 alunos correndo em tudo que é direção. Eu disse: Que guri? Eu não vi! Ele me respondeu: Tu já vai ver quem foi. Incontinente, ele correu atrás de um piá e deu-lhe um tapa na cara, que fez o guri sentar no chão. Aí ele olhou pra mim e disse: - Pronto, era assim que tu tinhas que fazer, seu covarde!

De repente, ouve-se um silêncio no recreio. Todos alunos se deram conta que havia um estranho dentro do colégio. E mais grave ainda, que tinha agredido um dos alunos. Começou o cerco no Fernando. Todos os alunos de guarda-pó branco, menos o Fernando. Ele puxou a minha mão pra eu fugir com ele. Já tinha derrubado até o pão com ovo. Era uma horda de alunos nos encurralando mais ou menos uns cem alunos e nós recuando.Era uma onda branca. O Fernando pulou uma pequena árvore que tinha no pátio, quebrou um galho e depois avança contra a gurizada. Foi um esparramo.

Fernando aproveitou a folga e mandou eu pular o muro. Eu pulei, ele veio atrás. Saímos numa rua de trás do grupo. Voltamos para ir para casa. Ele me xingando, porque eu disse que tinha que voltar para o colégio para buscar minha pasta. Porém, quando entramos de volta na Rua Mario Pezzi, onde nós morávamos e onde também ficava a escola...Surpresa! A escola toda nos encurralando de novo.

O irmão Fernandão disse pra mim: “Te encosta no muro, que eu já volto.” Saiu em dasabalada carreira e foi em direção à nossa casa. Eu fiquei ali mais acovardado que um coelho em frente a uma manada de lobos. Todos os garotos começaram a vir para cima e eu ali encostado no muro. Cheguei a pensar em dizer que não tinha nada com isso e que eu nem conhecia aquele louco...

Mas eis que a piazada começou a bater em retirada. Sabem por que? O Fernando vinha de volta correndo com um pedaço de ripa de dois metros de altura com uns pregos na ponta. O mano gritava uns palavrões e arrastava a ripa no chão e saía faísca pra tudo que é lado. Ficou engraçado: a rua tomada pelos alunos de um lado e o Fernando e sua ripa mágica de outro. No meio da multidão dos alunos, por azar do piá, o Fernando avista o dito que tinha me dado um encontrão. “Pra que, meu Jesus!” Foi direto no guri e disse: “Gurizada, vão embora. Deixem só ele aqui e dêem uma ripa pra ele.”

Arrumaram uma ripinha pro pobre do guri. Os alunos recuaram uns 10 15 metros da “arena”. O Fernando com a ripa de dois metros, eu na retaguarda tremendo de medo e de outro lado o gurizinho sentenciado.

O Duelo

O Fernando avançou em velocidade gritando palavrões, novamente. E dizia “Vou te matar, seu infeliz!” “Vou furar teus olhos”. O que aconteceu? O guri jogou a ripinha no chão e fugiu. Os outros torcedores também, todos afinaram. Cheio de moral, o Fernando continuava riscando no chão a ripa mágica. E os guris em tropel entraram na escola.

Eu que estava um pouco atrás, avistei o Fernando correndo, mas correndo muito. Aí eu disse: “Eles estão voltando”? E ele: “Os guris não. Quem vem vindo agora atrás de mim é o inspetor.” Corremos pra casa e fim de estória. Só não consigo lembrar onde é que ficou minha pasta!


autoria: Luiz Carlos Moralles Caldas, meu pai




Reproduzo aqui mais um trechinho já escrito pelo meu pai sobre o mano Fernando:

“ Depois de um duelo proposto por ele comigo, que nem começou, porque o Fernando tirou sarro do jeito que eu estava “em posição de luta”. Começou a rir, rir e rir cada vez mais. E eu furioso. Fomos os dois para casa e ele se matando de rir no quarto e eu escutando, me mordendo de ódio. A mãe pergunta porque ele estava rindo e eu respondo “porque é louco”. Na verdade ele tinha me derrotado só com a risada, sem me dar um tapa. Só com aquela gargalhada... que eu até hoje morro de saudades. Como este mano me faz falta. As vezes a saudade me dói por dentro....”

Meu pai e o Tio Fernando formam uma dupla infalível até hoje. O pai aqui na terrinha e o tio, meu padrinho, lá no céu sempre dando uma espiadinha por aqui. Durante toda a vida, talvez não tenha um dia que o Tio não tenha ligado pro pai – pra saber do futebol, dos filhos, da saúde ou falar de política...