12 de out. de 2008

HISTÓRIAS DO MEU PAI Nº 03



OS HÓSPEDES DA MINHA MÃE


Um dia apareceu em casa para ficar apenas “uns dias” uma senhora que eu não lembro quem era e o seu filho, um tal de Faeco. Esse guri tinha a minha idade mais ou menos e era o cara mais guloso que eu conheci. Quando a mãe vinha com o prato pronto da cozinha para servir um por um como ela tradicionalmente fazia, ele gritava: “ Para quem é este pratarrão?” A mãe respondia: “É pra ti, Faeco!”. O guloso dizia: “Mas só esta misgainha?”

Um dia deu uma caganeira nesse esfomeado que ele correu para o banheiro na hora que estávamos comendo a sobremesa – uma farta distribuição de laranjas. Não é que o tal de Faeco estava com a porta entreaberta para nos espionar, para ver o que estávamos comendo em sua ausência?! Quando ele viu, começou a gritar: “ Eu também queroooo laranja!” A mãe perdeu a paciência com ele e carregou da cozinha meio saco de laranjas e colocou bem na frente do rapazinho que continuava “sentadito” no trono. Ela fez isso para ver se ele se ofendia, mas que nada. O retardado ainda reclamou: “Mas cadê a faca?” Com faca e tudo, ficou lá cagando e comendo laranjas por umas duas horas mais ou menos. Só ouvi a mãe dizer: “ Este guri é fraco da cabeça, parece um biguá.” ( Biguá é uma ave pernalta que come peixe. Quando seu papo já está cheio, continua comendo só que os peixes entram pelo bico e saem pelo rabo na mesma hora.)


Outra senhora que também não lembro o nome foi passar “uns dias” em nossa casa e levou sua filha que tinha uns trinta anos e precisava recuperar a saúde, já que ela estava com anemia. Parece que as comadres da mãe nunca tinham ouvido falar de hospital! Era tudo lá em casa. O problema é que eu fui vítima da anemia a fulana.

Uma certa manhã fui fazer a inspeção rotineira no meu galinheiro e dei falta de um dos meus frangos de briga. Voltei para casa e entrei na cozinha para relatar o que tinha acontecido para a mãe. Foi um choque para mim. O meu frango estava dentro do panelão. Comecei a chorar e a mãe me levou par a fora e me explicou a bondade que tinha feito com o meu galinho: “Cala a boca, Luiz! Tive que matar o frango para fazer um caldinho porque a fulaninha está fraquinha.”

Imaginem o tamanho da minha raiva depois desta. Fui para cama entre lágrimas e com muita fé e respeito rezava: “O meu todo poderoso criador da terra e do céu. Dentro da sua infinita bondade, faça um favor para este seu servo que tanto lhe ama. Mate estas duas desgraçadas, ainda hoje se possível.” Mas, Deus não me ouviu.

A nossa hóspede, a mãe da fracote, dormia até as cinco da tarde, acordava e aparecia na sala com toda aquela vasta cabeleira branca, em pé parecendo uma alma de outro mundo. E dizia: “Já beberam café? Nem me esperaram.” Pobre da mãe, ainda tinha que ouvir isto. ( O tal “de quem é este pratarrão” e o “já beberam café” ficaram famosos em nossa família e anos e anos algum de nós sempre repetia.)
autoria: Luiz Carlos Moralles Caldas - meu pai

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